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Qui, Abr

Contratos suspensos, renda improvisada e vagas disponíveis: como estagiários estão lidando com a pandemia

Notícias EAD

Depois que a pandemia chegou ao Brasil e o novo coronavírus começou a se espalhar pelo país, Lizandra Nascimento Lima se viu obrigada a substituir a sua rotina do estágio em uma escola municipal na Serra, no Espírito Santo, para conseguir uma renda e bancar os custos da sua faculdade.

Depois que a pandemia chegou ao Brasil e o novo coronavírus começou a se espalhar pelo país, Lizandra Nascimento Lima se viu obrigada a substituir a sua rotina do estágio em uma escola municipal na Serra, no Espírito Santo, para conseguir uma renda e bancar os custos da sua faculdade.

Assim como muitos estudantes brasileiros, ela teve seu contrato de estágio suspenso quando a pandemia obrigou muitas empresas e o setor público a colocar seus funcionários para trabalhar remotamente e a cortar gastos. Com a bolsa-auxílio, remuneração dada aos estagiários, ela mantinha as mensalidades do curso de licenciatura em Educação Física em dia.

Sem o dinheiro do estágio como auxiliar de professora na educação especial, a jovem de 19 anos precisou improvisar para seguir com os estudos na Faculdade Doctum. "Agora na quarentena, sem o estágio e sem o auxílio emergencial, ficou bem difícil para a minha família, então precisei ajudar de algum jeito", conta Lizandra.

Com a suspensão de aulas na escola onde trabalha, o jeito foi trocar as salas de aula pela cozinha: junto com seu namorado e sua sogra, começou a preparar casadinhos para vender na região.

Então gente, estou vendendo esses casadinhos com neu namorado para pagar minha faculdade... pra quem não sabe além de ter o salário (do estágio) suspenso eu também não recebi o auxílio (sorte né) então tô me virando como posso... o saquinho tem 200g e está no valor de 6 REAIS! 

Com aulas online na faculdade, foi morar com a mãe durante a quarentena em Vitória, cidade vizinha da Serra e capital do estado. Ela não acreditava que a ideia poderia ajudar a bancar a rematrícula para continuar seu curso no próximo semestre. "No início não botei muita fé, não. Até porque está todo mundo sem dinheiro, onde que eu ia imaginar que alguém iria querer comprar?"

Mas com a divulgação nas redes sociais, os pedidos apareceram e, para atender toda a demanda, ela precisou de dedicação exclusiva aos casadinhos. "Nem sei que dia é hoje, não estou nem tendo tempo de mexer no celular, de tão ocupada que estou", brinca Lizandra, depois de terminar as entregas feitas no sábado (23).

"Acho que qualquer dinheirinho, qualquer cem reais que eu conseguir juntar, já ajuda muito em relação à minha família", ela diz, surpresa com a alta procura pelos doces e com os ganhos que vão ajudar no período sem o salário.

Segundo ela, os responsáveis pelo estágio afirmaram que, quando a situação se normalizar, os contratos de todos os estagiários serão retomados. "É o que eles dizem".

De acordo com o Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), principal sistema de integração de estagiários do Brasil, diversos setores desaceleraram as contratações por causa da pandemia. "As áreas mais afetadas são as que foram mais impactadas pelas medidas de isolamento, como o comércio, os escritórios, instituições de ensino, o pequeno empresário e os órgãos públicos", conta o gerente regional do CIEE de São Paulo, Cláudio Rodrigo de Oliveira.

Com a mesma estratégia de Lizandra, Diego Rufino, estudante de Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também apresentou nas redes sociais sua alternativa à suspensão do estágio.

Na segunda semana de março, ele começou a trabalhar como auxiliar de professor na rede pública de ensino do Rio de Janeiro. "Por ironia do destino, o surto do corona se iniciou naquela mesma semana. Então, o governador do Rio de Janeiro não viu outra medida a não ser paralisar as instituições [de ensino] públicas e privadas", lamenta Diego.

Com a situação de estágio indefinida, sua solução para manter as atividades na área da educação foi oferecer serviços de reforço escolar de Língua Portuguesa e Inglês, revisão gramatical e aulas online sobre redação para o Enem e outros vestibulares.

"Eu já me empenhava nesse trabalho há um tempo", relata Diego. "Mesmo com a faculdade e o estágio, fazia minhas revisões textuais e dava aulas em casa, conciliando um pouco de tudo. Com esse cenário atual, decidi abrir esse espaço totalmente e somente pra divulgação desse meu trabalho".

O estudante segue sem saber se seu contrato voltará a ter validade. "Infelizmente não recebi mais nenhum informe. Logo, o jeito é esperar".

Para o gerente regional do CIEE, a situação dos estagiários pode se normalizar quando o coronavírus passar a ser controlado. "A gente tem que acreditar que, quando isso passar, essas oportunidades para estagiários voltarão", conta Cláudio.

Mesmo com o contexto de aumento do desemprego que a pandemia vem causando, algumas áreas apresentam crescimento na demanda por profissionais e podem ampliar vagas de estágio. "Enquanto muitos setores desaceleram as contratações devido à disseminação do novo coronavírus, os setores essenciais correm contra o tempo para reforçar as equipes", afirma Cláudio.

Para áreas como saúde, varejo, indústria alimentícia, logística e comunicação, a previsão do CIEE é de um crescimento de 20% no volume de contratação de estagiários.

Cristiele Santos Pereira (18), aluna do curso técnico em Informática no Instituto Federal da Bahia (IFBA), em Porto Seguro, é um exemplo de quem conseguiu ser contratada em meio ao caos da atual crise. Ela se mudou de Santa Cruz Cabrália para a vizinha Eunápolis, cidades no Sul da Bahia, para fazer companhia a uma tia durante a quarentena.

Na empresa em que sua tia trabalha, uma loja de produtos agrícolas, havia vagas de estágio abertas, sem procura durante os meses de isolamento social. Ela, então, entrou em contato e se candidatou ao cargo, mesmo não sendo um emprego na sua área de estudos.

Logo depois de fazer a entrevista por telefone, Cristiele foi admitida para o emprego. "Conversando com o gerente da loja, percebi que consegui o estágio facilmente pois nesses dois meses não tinha ninguém procurando estágio e eu fui a primeira pessoa que foi atrás", ela relata.

Para facilitar e agilizar as contratações, o gerente regional do CIEE de São Paulo conta que medidas têm sido adotadas desde o começo da crise. Segundo ele, o tempo entre o anúncio da vaga e a contratação foi reduzido pela metade. Além disso, os candidatos possuem atendimento personalizado e as assinaturas dos Termos de Compromisso de Estágio estão sendo feitas eletronicamente, "de forma segura para todos os envolvidos".

Cláudio destaca ainda a importância de medidas de segurança sobre o coronavírus, inclusive com orientações de saúde e para a possibilidade de estágio em home office.

Cristiele diz tomar todos os cuidados necessários para trabalhar na loja. "Uso sempre a máscara quando saio, ando sempre com o álcool em gel na bolsa, uso o tempo todo no estágio, ao usar o computador, ao receber um cliente. O tempo todo é álcool em gel e lavando as mãos, porque a prevenção é essencial nesse momento", ela ressalta.

Com movimento bom na loja, a estagiária conta que os produtos agrícolas continuam sendo procurados por produtores da região e por um público novo. "Não só as pessoas que já possuem fazenda e compram produtos, mas também pessoas que resolveram fazer uma pequena horta para passar o tempo dentro de casa.”

No site do CIEE, os estudantes podem conferir todos os processos seletivos para vagas de estágio em andamento. O portal também oferece cursos online gratuitos para os jovens. "São cursos com temas que vão desde como montar um bom currículo até como se portar em uma entrevista", explica Cláudio.

No dia 5 de maio, por meio de uma live no Facebook da Prefeitura Municipal de Caraguatatuba, os estagiários que trabalham do Poder Executivo souberam de um decreto que suspendia por dois meses as atividades de 543 estudantes da cidade, no Litoral Norte de São Paulo.

A notícia pelas redes sociais surpreendeu os jovens. "De forma alguma estávamos preparados para isso, ninguém havia comentado qualquer rumor sobre", conta Evelyn Naiara da Silva (19), estudante do 3º semestre de Processos Gerenciais no Instituto Federal de São Paulo (IFSP).

Estagiária em uma unidade municipal de saúde especializada em atendimento para doenças infectocontagiosas, ela conta que, assim como seu papel, outros estagiários também exercem funções essenciais. "Muitos prestam serviços essenciais e estavam trabalhando todos os dias, outros estavam de casa ou então trabalhando por revezamento", ela conta.

A pandemia obrigou muitos servidores da prefeitura a se afastar, e os estagiários seguiam com funções importantes para a gestão e a suspensão poderia prejudicar os serviços da administração.

Além disso, com a bolsa-auxílio de R$ 1 mil suspensa, muitos não conseguiriam se sustentar. "A bolsa com certeza era de gênero alimentício para muitos. Para outros, era a única forma de manter a faculdade", disse Evelyn. "Muitos pais perderam seus empregos com a pandemia e os estagiários eram os únicos que mantinham a casa, fora aqueles que eram os próprios chefes das famílias", lembra ela.

Por isso, os universitários se mobilizaram para reverter essa situação. Ao conseguir cerca de mil assinaturas em um abaixo-assinado, buscaram apoio jurídico para anular a suspensão. Depois de uma ação popular organizada pelo estudante de Direito Hélio Monteiro junto com os estagiários, o Ministério Público de São Paulo deu parecer favorável aos estagiários no dia 15 de maio, com uma medida liminar que anulou a suspensão dos contratos.

"São 543 estagiários que desenvolvem atividades importantes em diversos setores da prefeitura", conta Hélio, autor da ação popular. "Eles são importantes para o bem do serviço público, além da bolsa-auxílio ser fundamental para manutenção dos cursos, pagamento de mensalidade e aluguel, sendo a fonte de renda para a sobrevivência de muitos", afirma.

No dia 19 de maio, em outra coletiva transmitida no Facebook, o prefeito de Caraguatatuba, Aguilar Júnior (MDB), citou a ação dos estagiários como uma "polêmica desnecessária" e disse que os estagiários vão seguir com as atividades de trinta horas semanais e recebendo a bolsa-auxílio normalmente.

Já no dia 20, Evelyn retornou normalmente ao estágio de seis horas diárias. "Foi uma experiência desgastante, mas estamos felizes por podermos retornar às atividades."

Em Brasília, senadores discutem suspensão de encerramentos de estágio durante pandemia
A discussão para que os prazos de encerramento de contratos de estágio sejam suspensos durante o período da pandemia chegou ao Senado Federal pelo projeto de lei 2.525/2020.

Apresentada em 11 de maio pelo senador Jean Paul Prates (PT/RN), a proposta alteraria a Lei de Estágio, que limita a duração dos contratos em dois anos, no máximo. Assim, as empresas prorrogariam o estágio durante o período de crise.

Em entrevista à Agência Senado, o senador afirmou que a finalização antecipada ou não renovação de contratos de estagiários trariam prejuízos tanto financeiros como de aprendizado profissional aos jovens. "É imprescindível manter a renda da juventude e de suas famílias durante esse período", contou à Agência Senado.

Cláudio Rodrigo de Oliveira, gerente regional do CIEE vê a pauta como positiva e torce por sua aprovação. "A bolsa-auxílio paga ao estagiário, neste momento tão delicado, pode garantir tanto a permanência na faculdade como o sustento da família", aponta.

O senador Jean Paul ainda disse à Rádio Senado que espera que o projeto seja aprovado rapidamente pelo Senado e pela Câmara, devido à atual situação emergencial.

Fonte: Revista QB