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Qui, Abr

Aprendizagem autorregulada é chave para superar as dificuldades atuais da educação

Notícias EAD

Cenário de aulas remotas colocou o estudante diante da necessidade de tomar decisões sobre seu próprio progresso, afirma o psicólogo americano e pesquisador na área de inteligência

Cenário de aulas remotas colocou o estudante diante da necessidade de tomar decisões sobre seu próprio progresso, afirma o psicólogo americano e pesquisador na área de inteligência

Desde as primeiras entrevistas com professores publicadas pelo Porvir no começo de 2020, oferecer ao aluno estratégias para organizar a rotina doméstica e acompanhar as aulas remotas eram itens que estavam no topo da lista. Distantes fisicamente, crianças e jovens não conseguiam estabelecer uma jornada de estudos, a mão levantada na sala de aula virtual muitas vezes não era vista e a câmera não estava sequer ligada.

Adotar metodologias centradas no aluno com foco em uma aprendizagem autorregulada é, segundo o psicólogo americano e pesquisador na área de inteligência Kevin McGrew, decisivo para o momento em que a educação atravessa a pandemia e também para o futuro.

McGrew, que participou do Seminário Internacional – Motivação: evidências para promover a aprendizagem, promovido pelo Instituto Ayrton Senna, destaca que é papel dos formuladores de políticas públicas desenhar currículos que deem ao aluno a oportunidade de entender como sua aprendizagem está progredindo, seja para terem confiança para pedir ajuda ou avançar para uma tarefa mais complexa. E se necessário deixar a palavra motivação de lado, tudo bem.

Porvir – O que a ciência já descobriu sobre o papel da motivação no aprendizado e que pode apoiar o trabalho de educadores?
Kevin McGrew – A história da motivação em psicologia e, em particular, da psicologia educacional, possui mais de 100 anos. Esse é um campo muito complexo e há cerca de duas dúzias de teorias diferentes sobre ele. Dessa forma, tentar explicar o que é motivação para professores, pais e alunos é muito difícil se você começar a entrar nas informações técnicas e históricas.

Um bom ponto é dizer que motivação não é um botão liga-desliga. O pensamento atual sobre motivação entende que se trata de um conjunto de diferentes características de um indivíduo, o que chamamos de constructos, que trabalham juntas para produzir um comportamento motivado e autorregulado. Não está ligada a apenas uma coisa, e é por isso que é tão difícil movê-la como um ponteiro ou a partir de um botão.

Em meu artigo sobre o tema, eu me concentro em três conjuntos de perguntas que podem ajudar a definir o que é motivação: o que eu preciso fazer para ser bem-sucedido nesta atividade?, por que eu quero perguntar sobre a atividade? esta atividade é do meu interesse?, esta atividade tem algum valor?, e por que eu me interessaria em fazer essa atividade ou não?

Explicar o que é motivação implica entender o que acontece quando se decide ‘cruzar o Rio Rubicão’ (expressão que se refere a tomar uma decisão arriscada de maneira irrevogável). É preciso ter um plano (refletir sobre o que precisa ser aprendido e as etapas ou estratégias específicas necessárias para atingir as metas de aprendizagem), traçar objetivos, e monitorar o progresso.

Da mesma forma, queremos que os alunos monitorem seu progresso e nem sempre dependam dos professores. ‘Como eu estou indo? Não estou muito bem. O que preciso fazer diferente, o que preciso mudar? Quando considero que aprendi por completo?’. Todas essas partes estão inter-relacionadas e existem ciclos de feedback (retornos avaliativos), mas essa é a maneira simples de pensar sobre o que é motivação.

Porvir – Em sala de aula, muitas vezes pode ser difícil chegar a todas essas camadas e surgem estratégias mais fáceis, como o ponto extra. O que você pode dizer sobre a efetividade para trazer motivação?
McGrew – Isso tem a ver com trazer uma motivação externa, como quando alguém coloca algo a sua frente que gera muito desejo. Isso funciona para alguns alunos e pode ser necessário especialmente para aqueles que podem ter uma longa história de fracasso escolar.

Talvez você até precise disso para dar o pontapé inicial, mas, no longo prazo, não queremos que os estudantes fiquem tentando achar qual é o incentivo para aprender mais. Existe um conceito chamado orientação para o objetivo, voltado para metas e desempenho que tem a ver com fazer bem, fazer melhor do que os outros, obter a melhor nota e status social.

Com os alunos, o que desejamos é o desenvolvimento de competência. É uma situação em que fazem porque querem aprender e progredir, mesmo que leve um tempo. Não tem a ver com ter um desempenho do mais alto nível e receber uma recompensa. Dessa forma, é aconselhável que o professor explique o objetivo de aprendizagem ou da unidade, ao invés de continuar sempre recorrendo a fatores extrínsecos.

Porvir – Qual o impacto da Covid no que temos discutido a respeito de motivação?
McGrew – A pandemia abalou o que alguns escritores chamam de modelo industrial de educação, onde todos vão para a mesma classe e o professor apresenta tudo. Você tem x semanas para aprender. Teve uma boa nota? Segue em frente. Não há muita tomada de decisão ou autorregulação por parte do aluno.

Não tenho conhecimento do que está acontecendo no Brasil em relação à aprendizagem híbrida, porém ela se tornou quase imperativo do que nossos sistemas educacionais devem fazer. Precisamos mudar para o que se chama mais de modelo de aprendizagem de tecnologia para a era da informação, que é mais voltado para o aluno, focado no acompanhamento e individualização da aprendizagem.

Os alunos que melhor aprendem online são aqueles que têm clareza sobre o desenvolvimento de competências, que sabem ajustar o percurso e tomar decisão de forma independente. Só que a maior parte das crianças não consegue, e por isso, a lacuna de aprendizagem está se ampliando.

Porvir – Em pesquisas recentes no Brasil, estudantes reclamam justamente dessa dificuldade em ter um ensino autorregulado. Como resolver isso?
McGrew – Esse é um ponto crucial para motivação e aprendizado agora. Por isso, eu estava quase me preparando para dizer, é que devemos parar de discutir motivação e passar a falar sobre aprendizagem autorregulada, que inclui motivação. Na verdade, para alguns teóricos, a motivação é apenas parte da aprendizagem autorregulada, que permite ao aluno ser independente, estabelecer objetivos, mantê-los e seguir em frente

A aprendizagem autorregulada é uma área que se tornou extremamente importante. Existe muita pesquisa acontecendo nos últimos 10, 20 anos, mas realmente ainda não entrou nos currículos de educação ensinando pessoas a definir metas realistas e estratégias autorreguladas. A maioria das pessoas aprende por conta própria.

Por conta da pandemia, se quisermos salvar uma geração de crianças e guiá-las para o futuro, precisamos fazer com que essas questões sejam temas do currículo. Gestores e professores não vão gostar de ouvir isso porque têm muita coisa a fazer agora, mas precisamos começar essa integração para que os jovens possam se tornar aprendizes por conta própria, o que é justamente o que o mundo do trabalho vai exigir.

É uma mudança de paradigma completa, mais centrada no aluno. Pode-se trabalhar junto a um colega em um projeto, estabelecer metas, desenvolver um plano de ação. Se um aluno tiver dificuldade, precisa ser capaz de deixar o projeto temporariamente, pesquisar online ou voltar à sala de aula, virtual ou presencial, para então retomar o trabalho com os demais. É um ensino completamente diferente.

Fonte: Porvir