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Qui, Maio

A biblioteca do século 21

Notícias EAD

Segundo dados do Censo Escolar 2013, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e disponíveis no portal QEdu, das 190.706 escolas públicas e particulares do Brasil, apenas 66.745 instituições (35%) têm uma biblioteca. O índice não difere muito de 2010 (33,1%), quando foi aprovada a Lei n. 12.244, que estipula que todas as escolas do país devem ter uma biblioteca até 2020.

Levando em conta que os dados do censo referem-se à última quarta-feira de maio de 2013, é preciso construir 44,7 bibliotecas por dia até o final de 2020 para o Brasil cumprir a meta definida em lei – uma tarefa hercúlea, principalmente se as escolas não souberem o que fazer com esses espaços de leitura e estudo e como estruturá-los.

O documento Biblioteca escolar como espaço de produção do conhecimento: parâmetros para bibliotecas escolares, elaborado pelo Grupo de Estudos em Biblioteca Escolar (Gebe) da Escola de Ciência da Informação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e publicado em 2010, define bibliotecas escolares como espaços de aprendizagem que propiciam e estimulam conexões entre saberes; são laboratórios − não de equipamentos e apetrechos, mas de ideias. Tais parâmetros constituem um referencial flexível para que as escolas – públicas ou particulares – embasem sua decisão sobre a biblioteca com a qual desejam contar: espaço físico, acervo físico e/ou digital, presença de computadores, funções do bibliotecário etc. (confira no infográfico no final da página os parâmetros definidos pelo Gebe).

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Essas orientações são de grande importância, pois, de acordo com Christine Fontelles, diretora de Cultura e Educação do Instituto Ecofuturo, “a relevância da biblioteca se deve ao fato de que nós não nascemos leitores, com a habilidade de leitura. Isso é algo que demanda toda uma vida para que você possa efetivamente ter intimidade, habilidade, e inclusive desenvolver aquele hábito, aquele gosto de não se deixar abater diante de um texto difícil”. Christine, que também é idealizadora da campanha “Eu quero minha biblioteca”, crê que esse espaço é vital para uma instituição educacional, uma vez que se trata um ambiente ideal para leitura – e sem saber ler não há como ensinar. “A leitura é parte de um objetivo maior, que é a educação. A leitura é transversal à educação”, afirma. João Ceccantini, professor da Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho (Unesp) e doutor em Letras, também destaca a importância das bibliotecas para a escola, mas faz uma ressalva: é preciso que esses ambientes passem por uma modificação para condizer com o atual momento da sociedade. “A dimensão mais importante, pois nisso está a maior diferença de antigamente para os dias atuais, é a ideia de que a biblioteca está ligada ao indivíduo sozinho, fazendo sua leitura, sua pesquisa. O silêncio era uma questão de honra e, hoje, temos que ter em mente que a biblioteca é um espaço muito especial e único para a socialização das leituras realizadas”, explica Ceccantini, que traça um paralelo com as livrarias: “As grandes livrarias encontraram um caminho muito rico, que foi uma comunicação maior com seus potenciais consumidores, e multiplicaram as dimensões que antes não se levavam em conta na hora de montar esse espaço. Você não vai lá só para comprar um livro. Tem um monte de outras coisas, outras linguagens, outros suportes e objetos culturais disponíveis”.

Bernadete Campello, professora da Escola de Ciência da Informação da UFMG e coordenadora da equipe que elaborou o documento com os parâmetros para bibliotecas escolares, também defende a ideia de que, para se tornar um espaço mais atraente, a biblioteca deve mudar seus costumes – mas não radicalizar e abandoná-los completamente. “O mais importante é a capacidade que uma biblioteca tem de ser um lugar acolhedor, que propicie oportunidades de descobertas e prazer em ler e aprender. Não pode ser um espaço especialmente burocrático: regras e silêncio são necessários – mesmo as crianças menores entendem, e até apreciam, essas características da biblioteca –, desde que não sejam em excesso”, esclarece Bernadete, que é mestre em Biblioteconomia.

A renovação da biblioteca precisa, entretanto, estar ligada ao projeto político-pedagógico (PPP) da escola. “Ela [a biblioteca] não pode ser apenas um espaço para atividades esporádicas, extracurriculares, mas precisa ter todo seu potencial aproveitado; precisa estar permanentemente engajada no trabalho educativo de formar leitores e aprendizes autônomos”, afirma Bernadete. Para Christine, “é preciso pensar a biblioteca dentro dessa missão da escola e em como essa biblioteca atua, de maneira orgânica, no planejamento educacional proposto pela escola”.

O bibliotecário e o acervo
A Biblioteca Real de Alexandria era famosa por deter praticamente todo o conhecimento da Antiguidade: cerca de 700 mil rolos e pergaminhos se perderam com sua destruição, no século VII. Uma biblioteca escolar não precisa de um acervo de tamanho colossal, mas é preciso mantê-lo atualizado e organizado. “A organização do acervo com base em sistemas bibliográficos universais é essencial, em primeiro lugar, para garantir a localização de itens específicos com facilidade e rapidez. Além disso, sendo essa uma organização padronizada, ela vai permitir aos alunos a familiaridade com um sistema que é usado universalmente, dando a eles a capacidade de usar futuramente outras bibliotecas com mais facilidade”, destaca Bernadete.

Nada disso é possível, porém, sem a presença do bibliotecário, figura conhecida dos professores e alunos e que deve ser capaz de auxiliá-los em suas pesquisas e atividades. “A pessoa que trabalha na biblioteca tem que ser leitora – leitora voraz –, que vá atrás das informações, dos lançamentos e que seja muito antenada, de modo que possa oferecer novas experiências de leitura”, explica Christine. O professor Ceccantini afirma que o profissional responsável pela biblioteca não deve ser mais “aquele guardião de livros, que está mais preocupado que eles estejam em ordem, que não sejam estragados”. O pesquisador paulista defende a ideia de que o bibliotecário deve ser capaz de valorizar e reconhecer diferentes mídias e tipos de leitura, como os quadrinhos e os livros mais comerciais, de modo a oferecer atividades e experiências inovadoras – algo que a diretora do Instituto Ecofuturo compara com a dinâmica de uma viagem: “Você pode fazer um roteiro turístico ou pode se munir de um guia adquirido gratuitamente e descobrir coisas incríveis”.

Bernadete, por sua vez, ressalta a importância da formação em Biblioteconomia para o profissional que irá gerenciar e cuidar da biblioteca: “É esse profissional que garantirá a necessária organização e gestão eficiente do espaço, como também a articulação da biblioteca ao currículo escolar”, diz. No entanto, a professora afirma que o mais importante é que esse educador, acima de tudo, compreenda a verdadeira função desse espaço. “Independentemente da formação básica do profissional que trabalha na biblioteca, ele deve ser capacitado para entendê-la como um espaço de descobertas, e não de respostas prontas, de questionamento, e não de verdades absolutas”.

Com um acervo atualizado e um mediador competente, a professora da UFMG não tem dúvidas de que a biblioteca estará bem equipada não somente para incentivar a leitura, mas também para formar leitores. “A biblioteca pode ser o espaço que oferece um acervo rico e variado, provê a mediação adequada, de forma constante e regular, e cria uma cultura de leitura na escola, ambiente ideal para a formação de leitores persistentes”, diz Bernadete. Na opinião de João Ceccantini, esse espaço deve ser tido como o “cérebro da escola”, pois “a biblioteca pode ser um espaço para o sujeito amadurecer, desenvolver autonomia e escolher seus livros”.

Parcerias
Tanto Bernadete quanto Christine destacam a importância de parcerias para o estabelecimento das bibliotecas nas escolas da rede pública, que muitas vezes se veem de mãos atadas por dependerem de verbas governamentais. A pesquisadora da UFMG considera as parcerias fundamentais para a rede pública de ensino em todas as esferas. “Isso pode acontecer, por exemplo, por meio do apoio da biblioteca pública de um município às bibliotecas escolares ou por meio da constituição de redes de bibliotecas apoiadas pelas secretarias de Educação, que propiciem o compartilhamento de softwares de organização de acervos e de outros recursos, inclusive humanos”, explica.

projeto ler e preciso minChristine defende ainda que parcerias com instituições privadas são um passo importante para melhorar o cenário preocupante descrito na abertura da matéria. “Somos um país de proporções continentais, por isso o que precisamos, para dar conta dos desafios, é de cooperação. Trata-se de um compromisso assumido pelo país, que utiliza

O futuro a assinatura ‘pátria educadora’, e só com a disponibilidade de recursos é que a gente será, de fato, uma pátria educadora”, afirma a diretora do Ecofuturo, que desenvolve o projeto Ler é Preciso, por meio do qual o instituto busca auxílio para a construção e a manutenção de bibliotecas ao redor do país (saiba mais sobre o projeto no box ao lado).

Assim como as escolas, as bibliotecas também estão inserindo as novas tecnologias em sua rotina e infraestrutura. De acordo com Bernadete, muitas bibliotecas, principalmente as universitárias e as especializadas, assimilaram tecnologias e informatizaram processos e serviços. “Muitas têm, atualmente, seus catálogos automatizados, empréstimo on-line, projetos de digitalização de acervos, acesso a bases de dados externas, repositórios digitais e outros serviços baseados em tecnologia”, diz. No entanto, a pesquisadora adverte que as tecnologias podem afastar o jovem dos livros.

Ceccantini, por sua vez, crê que as bibliotecas podem utilizar a internet e os dispositivos móveis para atrair os jovens. Ele acredita que elas repensarão seu papel na sociedade e encontrarão novas funções. Os nichos e os gostos literários são exemplos citados pelo educador. “O que hoje é uma possibilidade, antes era um pouco mais difícil, era uma coisa para poucos, cada um encontrar o seu nicho, encontrar outras pessoas que gostassem muito de alguma coisa, algum tema ou autor que você também gostasse muito. Isso ficou muito fácil com esse cenário eletrônico”, observa o professor da Unesp.

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*Escrito por Fábio Torres

Fonte: Gestão Educacional
Publicado em: 22/08/2016