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03
Sex, Maio

Influenciada por novas tecnologias, processo educacional passa por transformação e requer um novo tipo de educador

Notícias EAD

O mundo está passando por uma crise de paradigmas que coloca o processo educacional em um momento de transição. Surgiram novos valores, novos referenciais, e eles estão convivendo com os antigos, explica a educadora e escritora Patrícia Lins e Silva, profissional reconhecida pela leitura que faz da transformação em curso.

As pessoas falam muito nisso como se fosse coisa normal, natural, mas não é. Para começo de conversa, é uma crise. E é sofrida, é complicada”, avisa. Significa tirar todos os seus referenciais e mudá-los radicalmente, acredita. Em suas palestras e no seu livro, Inteligência se Aprende, quando fala a respeito dos desafios de uma mudança de paradigma, ela lembra que Galileu (Galilei, filósofo) quase foi para a fogueira por dizer que era a Terra que orbitava ao redor do Sol, e não o inverso, como se acreditava.

Do mesmo modo, certezas a respeito da Educação estão mudando, arrastadas por novas tecnologias e mudanças sociais. Patrícia Lins e Silva é uma das sócias da Escola Parque Rio, que adota o sistema educacional apresentado pelo educador baiano Anísio Teixeira, onde o desenvolvimento do aluno é pensado em uma perspectiva geral. Educação é um dos temas do Fórum Agenda Bahia, uma realização do jornal CORREIO e da rádio CBN, em parceria com Braskem, Coelba, Fieb e prefeitura de Salvador.

Como se aprende a ser inteligente?
Inteligência não é um dom. É uma característica da espécie humana. Todos nascemos inteligentes, se entendermos inteligência como capacidade de aprender. Um ambiente que proporcione ao sujeito experiências diversas e estimulantes, que provoquem a capacidade de pensar, desenvolve a inteligência.

Como se dá o aprendizado?
Existem várias teorias sobre a aprendizagem que podemos, de modo bem simplista, reduzir a duas: o comportamentalismo e o construtivismo. A primeira postula que se aprende por repetição ou por modelo ou exemplo. O aluno é uma folha em branco onde se escreve. O foco é no ensino. É o mais recorrente. Já o construtivismo afirma que o conhecimento é construído pelo sujeito numa interação com a realidade. Sujeito e objeto interagem e é nesse encontro que se constrói conhecimento. O foco está na aprendizagem. Muito mal compreendido, erroneamente o construtivismo tem sido culpado pelos males da educação brasileira.

A senhora fala em uma mudança de paradigma na Educação. Qual é este novo paradigma?
Estamos num momento de transição, mudando de paradigma, mas ainda não está claro qual virá a se estabelecer. Mudar paradigma é traumático e assustador. Galileu, quando disse que a Terra girava à volta do Sol, foi condenado a morrer queimado vivo numa fogueira porque, naquele momento da História, acreditava-se que o Sol é que girava à volta da Terra. Era uma verdade inquestionável, o que tornava inaceitável afirmar o contrário. Assim, na escola, é chocante mudar do atual paradigma conhecido, com salas divididas por idade, ano letivo, currículo único, cadeiras umas atrás das outras e professor na frente, provas, dever de casa, etc. Um novo paradigma se estabelecerá quando o entendimento de que a escola que ainda existe nos moldes do século XIX não serve mais para formar as gerações do século XXI. Agora já não serve mais, porém, ainda não se chegou a um ponto crítico entre o que é oferecido pela escola e o tipo de pessoas de que a sociedade precisa.

Qual é o papel da escola e dos pais no processo educacional?
A escola, hoje, deve influenciar muito a educação dos alunos. O mundo mudou e a família mudou, as pessoas trabalham e têm pouco tempo. Assim, a escola deve assumir algumas funções que antes ficavam com a família, como a de educar social e moralmente. Escola não é só para informar conteúdos. Hoje, família é quem cuida da criança, e continua tendo o importante papel de dar afeto e assegurar o bem-estar. Para se sentir cuidada e amada, a criança precisa de direção, de quem lhe diga o que fazer e o que não fazer, estabelecer a hora de dormir e comer, hora de estudar e ler, de usar o tablet ou brincar. A escola é uma instituição que funciona como a família no desenvolvimento das crianças. Ela também dá afeto e cuida, mas o pertencimento a um núcleo menor e particular é importante para a criança.

Qual será a função do professor no futuro?
Num mundo em que as informações estão nos sites de busca e que basta digitar num teclado, a qualquer hora e em qualquer lugar, para obter todo tipo de informação, o professor passa de transmissor de conhecimentos a orientador da aprendizagem dos alunos, propondo questões da vida real para ser pesquisadas e solucionadas.

Como se desperta o desejo de aprender nas pessoas?
Instigando-as com desafios interessantes, com questões da vida real. Em vez de aulas-palestras, os professores poderiam propor questões que instiguem a capacidade de pensar dos alunos, questões que podem resolver com outros, conversando e pesquisando nos computadores. Um ambiente inteligente, no sentido de ter desafios intrigantes, reais, dentro do interesse do aprendiz, costuma despertar a curiosidade que leva à vontade de obter respostas, e essa vontade é aprender.

Que conhecimentos são indispensáveis para o futuro?
Saber se comunicar e saber pensar com lógica são a base para todos os conhecimentos. A comunicação oral e escrita (nos computadores, claro) permite interpretar os textos de qualquer área de conhecimento e comunicar e trocar ideias. Aprender a ler o mundo para além das percepções mais básicas leva a compreender as ciências. A capacidade de criar e inventar soluções será fundamental no futuro.

As novas tecnologias estão criando novas profissões, que demandam novos conhecimentos. Qual a melhor maneira de preparar as crianças para este ambiente?
Num mundo em transformação acelerada, as próximas gerações terão que aprender a se adaptar a mudanças com rapidez e terão que enfrentar e solucionar problemas.

O que esperar das mudanças propostas pelo governo para o ensino médio?
O ensino médio tem que mudar. Está muito ultrapassado. As propostas do Ministério da Educação são bastante boas, do meu ponto de vista. Mas existem, pelo menos, dois problemas que podem fazer com que, em vez de melhorar o ensino médio, ele fique pior. Um deles é sustentação financeira. Para garantir a mudança será preciso investir nas escolas. E outro problema é garantir que todos tenham acesso aos cursos de seu interesse e não apenas aos de menor custo. Por exemplo, um laboratório de ciências implica investimento, o que pode significar a não oferta de cursos voltados para as ciências. Ora, o século XXI é o século da ciência e o Brasil não deve ficar fora das tendências mundiais. Não sei como será garantido o investimento com o limite geral do teto de gastos. Será que a Educação será priorizada como deveria ter sido sempre?

Qual a relação entre a Educação e a produtividade econômica?
O capital humano é fundamental para o desenvolvimento de um país. A educação é que valoriza esse capital, preparando mão de obra mais especializada e mais qualificada, formando cidadãos mais consistentes na sua participação na sociedade. Os países considerados mais ricos e produtivos valorizam a educação, investem nela, priorizam o desenvolvimento e formação de seus habitantes porque reconhecem que cidadãos preparados significam melhor produção.

Fonte: Correio 24h
Publicado em: 15/11/2016